quarta-feira, 28 de maio de 2014

ENTREVISTA CONCEDIDA PELO SANTO PADRE AOS JORNALISTAS DURANTE O VOO DE REGRESSO DA TERRA SANTA

P.- Santo Padre, depois do Médio Oriente, voltamos agora para a Europa. Vossa Santidade está preocupado com o crescimento do populismo na Europa, que ainda ontem se manifestou nas eleições europeias?

R. - (Santo Padre)
Nestes dias, só tive tempo para rezar o Pai Nosso… Verdadeiramente não segui as notícias das eleições. Não tenho os dados: quem venceu, quem perdeu… Não segui as notícias. Populismo, em que sentido? Pode-me dizer?

P. - No sentido que hoje muitos europeus têm medo, pensam que não haja futuro na Europa. Há muito desemprego e o partido anti-europeu registou um forte crescimento nestas eleições…

R. – Este é um argumento de que ouvi falar: da Europa, da confiança ou desconfiança na Europa. Inclusive a propósito do euro, alguns querem voltar atrás... Destas coisas, não entendo muito. Mas o senhor disse uma palavra-chave: o desemprego. Este é grave. É grave, porque – eu interpreto assim, simplificando – estamos num sistema económico mundial, em que, no centro, está o dinheiro, não a pessoa humana. Num verdadeiro sistema económico, no centro devem estar o homem e a mulher, a pessoa humana. E hoje, no centro, está o dinheiro. Para se manter, para se equilibrar, este sistema deve ir em frente com algumas medidas «de descarto». E descartam-se as crianças – o nível de natalidade na Europa não é muito elevado! Creio que a Itália tem 1,2 por família; vós, em França, tendes 2…  um pouco mais; a Espanha, menos do que a Itália: não sei se chega a 1… Descartam-se as crianças. Descartam-se os idosos: os velhos já não servem; conjunturalmente, neste momento, vão encontrá-los porque são reformados e precisam da sua reforma, mas é um facto conjuntural. Descartam-se os idosos, mesmo com situações de eutanásia escondida, em muitos países. Ou seja, os remédios são fornecidos até um certo ponto, e assim… E, neste momento, descartam-se os jovens… Isto é gravíssimo, é gravíssimo. Na Itália, creio que o desemprego juvenil atinge quase 40%, não tenho a certeza. Na Espanha, tenho a certeza que anda pelos 50%; e na Andaluzia, no sul da Espanha, 60! Isso significa que há toda uma geração de «nem… nem…»: nem estudam, nem trabalham. E isto é gravíssimo! Descarta-se uma geração de jovens. Para mim, esta cultura do descarte é gravíssima. Mas isto não sucede só na Europa, verifica-se um pouco por toda a parte; na Europa, sente-se forte. Faz-se a comparação com a cultura do bem-estar de há 10 anos. E isto é trágico. É um momento difícil. É um sistema económico desumano. Não tive medo de escrever na Exortação Evangelii gaudium: este sistema económico mata. E repito-o. Não sei se fui um pouco ao encontro da sua preocupação... Obrigado.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

PAPA FRANCISCO AUDIÊNCIA GERAL, 21 de Maio de 2014 - Dom da Ciência nos faz compreender a criação com obra de Deus

Hoje, gostaria de elucidar mais um dom do Espírito Santo, a dádiva da ciência. Quando se fala de ciência, o pensamento dirige-se imediatamente para a capacidade que o homem tem de conhecer cada vez melhor a realidade que o circunda e de descobrir as leis que regulam a natureza e o universo. Contudo, a ciência que deriva do Espírito Santo não se limita ao conhecimento humano: trata-se de um dom especial, que nos leva a entender, através da criação, a grandeza e o amor de Deus e a sua profunda relação com cada criatura.

Quando são iluminados pelo Espírito, os nossos olhos abrem-se à contemplação de Deus, na beleza da natureza e na grandiosidade do cosmos, levando-nos a descobrir como tudo nos fala d’Ele e do seu amor. Tudo isto suscita em nós um grandioso enlevo e um profundo sentido de gratidão! É a sensação que sentimos também quando admiramos uma obra de arte, ou qualquer maravilha que seja fruto do engenho e da criatividade do homem: diante de tudo isto, o Espírito leva-nos a louvar o Senhor do profundo do nosso coração e a reconhecer, em tudo aquilo que temos e somos, é um dom inestimável de Deus e um sinal do seu amor infinito por nós.

No primeiro capítulo do Génesis, precisamente no início da Bíblia inteira, põe-se em evidência que Deus se compraz com a sua criação, sublinhando reiteradamente a beleza e a bondade de tudo. No final de cada dia está escrito: «Deus viu que isso era bom» (1, 12.18.21.25): se Deus vê que a criação é boa, é bela, também nós devemos assumir esta atitude e ver que a criação é boa e bela. Eis o dom da ciência, que nos faz ver esta beleza; portanto, louvemos a Deus, dando-lhe graças por nos ter concedido tanta beleza! E quando Deus terminou de criar o homem, não disse «viu que isso era bom», mas disse que era «muito bom» (v. 31). Aos olhos de Deus, nós somos a realidade mais bela, maior, mais boa da criação: até os anjos estão abaixo de nós, nós somos mais do que os anjos, como ouvimos no livro dos Salmos. O Senhor ama-nos! Devemos dar-lhe graças por isto. O dom da ciência põe-nos em profunda sintonia com o Criador, levando-nos a participar na limpidez do seu olhar e do seu juízo. E é nesta perspectiva que nós conseguimos encontrar no homem e na mulher o ápice da criação, como cumprimento de um desígnio de amor que está gravado em cada um de nós e que nos faz reconhecer como irmãos e irmãs.

Tudo isto é motivo de serenidade e de paz, e faz do cristão uma testemunha jubilosa de Deus, no sulco de são Francisco de Assis e de muitos santos que souberam louvar e cantar o seu amor através da contemplação da criação. Mas ao mesmo tempo, o dom da ciência ajuda-nos a não cair nalgumas atitudes excessivas ou erradas. A primeira é constituída pelo risco de nos considerarmos senhores da criação. A criação não é uma propriedade, que podemos manipular a nosso bel-prazer; nem muito menos uma propriedade que pertence só a alguns, a poucos: a criação é um dom, uma dádiva maravilhosa que Deus nos concedeu, para acuidarmos e utilizarmos em benefício de todos, sempre com grande respeito e gratidão. A segunda atitude errada é representada pela tentação de nos limitarmos às criaturas, como se elas pudessem oferecer a resposta a todas as nossas expectativas. Com o dom da ciência, o Espírito ajuda-nos a não cair neste erro.

Mas gostaria de voltar a meditar sobre o primeiro caminho errado: manipular a criação, em vez de a preservar. Devemos conservar a criação, porque é uma dádiva que o Senhor nos concedeu, um dom que Deus nos ofereceu; nós somos guardas da criação. Quando exploramos a criação, destruímos o sinal do amor de Deus. Destruir a criação significa dizer ao Senhor: «Não me agrada». E isto não é bom: eis o pecado!

A preservação da criação é precisamente a conservação do dom de Deus; e significa dizer a Deus: «Obrigado, eu sou o guardião da criação, mas para a fazer prosperar, e não para destruir a tua dádiva!». Esta deve ser a nossa atitude em relação à criação: preservá-la, pois se aniquilarmos a criação, será ela que nos destruirá! Não esqueçais isto! Certa vez eu estava no campo e ouvi o dito de uma pessoa simples, que gostava muitos de flores e que as preservava. Ela disse-me: «Devemos conservar estas belezas que Deus nos concedeu; a criação é para nós, a fim de beneficiarmos dela; não a devemos explorar, mas conservar, porque Deus perdoa sempre; nós, homens, perdoamos algumas vezes, mas a criação nunca perdoa, e se tu não a preservares, ela destruir-te-á!».

Isto nos leve a pensar e a pedir ao Espírito Santo a dádiva da ciência, para compreender bem que a criação é o dom mais bonito de Deus. Ele fez muitas coisas boas para a melhor coisa, que é a pessoa humana.


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