sábado, 12 de abril de 2014

Papa Francisco: “Também hoje existe a ditadura do pensamento único”


“Também hoje existe a ditadura do pensamento único” que mata “a liberdade dos povos, a liberdade das pessoas, a liberdade das consciências”: é necessário “vigiar e rezar”. Foi o que disse o Papa na missa celebrada nesta manhã de quinta-feira na Casa Santa Marta. 

Deus prometeu a Abraão que seria pai de muitas nações, mas ele e seus descendentes deveriam observar a aliança com o Senhor. A homilia do Papa Francisco inspirou-se na primeira leitura de hoje para explicar a rejeição dos fariseus à mensagem de Jesus: o erro deles – destacou –, foi o de “remover os mandamentos do coração de Deus”. Eles pensavam que tudo se resolvesse apenas em observar os mandamentos, mas os mandamentos - disse o Papa – “não são uma lei fria”, porque nascem a partir de uma relação de amor e são “indicações” que nos ajudam a evitar erros no nosso caminho para encontrar Jesus. 

Assim, os fariseus fecham seus corações e mentes “a cada novidade”, não entendem “o caminho da esperança”. “É o drama do coração fechado, o drama da mente fechada - afirmou o Papa - e quando o coração está fechado, este coração fecha a mente, e quando coração e mente estão fechados, não há lugar para Deus”, mas apenas para o que acreditamos que deve ser feito. Em vez disso, “os mandamentos trazem uma promessa e os profetas despertam essa promessa”. Aqueles que têm coração e mente fechados não conseguem acolher “a mensagem de novidade”, trazida por Jesus, que, “é o que foi prometido pela fidelidade de Deus e dos profetas. Mas eles não entendem”:

“É um pensamento fechado, que não está aberto ao diálogo, à possibilidade de que existe outra coisa, a possibilidade de que Deus fale conosco, nos diga como é o seu caminho, como fez com os profetas. Essas pessoas não ouviram os profetas e não ouviram Jesus. É algo mais do que uma mera teimosia. Sim, é algo mais: é a idolatria de seu próprio pensamento. Eu penso assim, isso deve ser assim, e nada mais. Essas pessoas tinham um único pensamento e queriam impor este pensamento ao povo de Deus, por isso Jesus os repreende: ‘Vocês colocam sobre os ombros do povo muitos mandamentos e vocês não os tocam nem mesmo com um dedo”.

Jesus “repreende a incoerência deles”. “A teologia dessas pessoas – observou o Papa - tornou-se escrava deste esquema, desse modo de pensar: o pensamento único”: 

“Não há nenhuma possibilidade de diálogo, não há possibilidade de se abrir à novidade que Deus traz com os profetas. Essas pessoas mataram os profetas; fecham a porta para a promessa de Deus. E quando na história da humanidade ocorre esse fenômeno de pensamento único, quantas desgraças. No século passado vimos todos nós as ditaduras do pensamento único, que acabaram matando tantas pessoas, mas no momento em que se sentiam patrões não se poderia pensar de outra forma. Nós pensamos assim”.

Mas “também hoje - prossegui o Papa – existe a idolatria do pensamento único”:

“Hoje temos que pensar assim, e se você não pensa assim, você não é moderno, você não está aberto, ou pior. Muitas vezes dizem alguns governantes: “Mas, eu peço ajuda, uma ajuda financeira para isso; mas se você quiser essa ajuda, você tem que pensar assim e tem que fazer essa lei, essa outra, essa outra... ' Também hoje, há uma ditadura do pensamento único e esta ditadura é a mesma dessas pessoas: pega as pedras para lapidar a liberdade dos povos, a liberdade das pessoas, a liberdade das consciência, a relação das pessoas com Deus. E hoje Jesus é crucificado de novo”.

A exortação do Senhor “diante desta ditadura – concluiu o Papa – é sempre a mesma: vigiar e rezar; não ser tolo, não comprar “coisas” que não servem e ser humildes e rezar, para que o Senhor sempre nos dê a liberdade do coração aberto, para receber a sua Palavra que é promessa, alegria e aliança! E com esta aliança ir para a frente”. (SP)


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segunda-feira, 7 de abril de 2014

O sobrenome de Deus - Homilia de Papa Francisco

O homem é o sobrenome de Deus: de facto, o Senhor pega o nome de cada um de nós – quer sejamos santos quer pecadores – para fazer dele o próprio sobrenome. Porque ao encarnar-se o Senhor fez história com a humanidade: a sua alegria foi partilhar a sua vida connosco, «e isto comove: tanto amor, tanta ternura».
Na homilia, centrada na presença de Deus na história da humanidade, o bispo de Roma indicou em dois termos – herança e genealogia – as chaves para interpretar respectivamente a primeira leitura (relativa à profecia de Jacob que reúne os seus filhos e prediz uma descendência gloriosa para Judá) e o excerto evangélico que contém a genealogia de Jesus. Reflectindo em particular sobre esta última, evidenciou que não se trata de «uma lista telefónica», mas de «um tema importante: é história pura», porque «Deus enviou o seu filho» entre os homens. E, acrescentou, «Jesus é consubstancial ao pai, Deus; mas também consubstancial à mãe, uma mulher. E esta é aquela consubstancialidade da mãe: Deus fez-se história, Deus quis tornar-se história. Está connosco. Caminhou connosco».
Um caminho – prosseguiu o bispo de Roma – iniciado há muito tempo, no Paraíso, logo depois do pecado original. De facto, a partir daquele momento, o Senhor «teve uma ideia: caminhar connosco». Por isso «chamou Abraão, o primeiro nomeado nesta lista, e convidou-o a caminhar. E Abraão começou aquele caminho: gerou Isaac, e Isaac gerou Jacob, e Jacob Judá». E assim por diante, avançando na história da humanidade. Portanto, «Deus caminha com o seu povo», porque «não quis salvar-nos sem história; quis fazer história connosco».
Uma história, afirmou o Pontífice, feita de santidade e de pecado, porque na lista da genealogia de Jesus há santos e pecadores. Entre os primeiros o Papa recordou «o nosso pai Abraão» e «David, que depois do pecado se converteu». Entre os segundos indicou «pecadores de alto nível, que cometeram pecados graves», mas com os quais Deus igualmente «fez história». Pecadores que não souberam responder ao projecto que Deus tinha imaginado para eles: como «Salomão, tão grandioso e inteligente, que acabou como um pobrezinho que nem sabia como se chamava». E no entanto, constatou o Papa Francisco, Deus estava também com ele. «E isto é bonito: Deus faz história connosco. E mais, quando Deus quer dizer quem é, diz: eu sou o Deus de Abraão, de Isaac, de Jacob».
Eis por que à pergunta «qual é o sobrenome de Deus?» para o Papa Francisco é possível responder: «Somos nós, cada um de nós. Ele toma nosso nome para fazer dele o seu sobrenome». E no exemplo oferecido pelo Pontífice não estão só os pais da nossa fé, mas também de pessoas comuns. «Eu sou o Deus de Abraão, de Isaac, de Jacob, de Pedro, de Mariazinha, de Harmony, de Marisa, de Simão, de todos. De nós assume o sobrenome. O sobrenome de Deus é cada um de nós», explicou.
Eis a constatação de que tomando «o sobrenome do nosso nome, Deus fez história connosco»; aliás, ainda mais: «deixou que escrevêssemos a história». E nós ainda hoje continuamos a escrever «esta história» que é feita «de graça e de pecado», enquanto o Senhor não se cansa de nos seguir: «esta é a humildade de Deus, a paciência de Deus, o amor de Deus». De resto, também «o livro da Sabedoria diz que a alegria do Senhor está entre os filhos do homem, connosco».
«Ao aproximar-se o Natal» para o Papa Francisco – como ele mesmo confidenciou concluindo a reflexão – foi natural pensar: «Se ele fez a sua história connosco, se tomou o seu sobrenome de nós, se deixou que escrevêssemos a sua história», nós por nossa vez deveríamos deixar que Deus escrevesse a nossa. Porque, esclareceu, «a santidade» é precisamente «deixar que o Senhor escreva a nossa história». E estes foram os votos de Natal que o Pontífice quis dirigir «a todos nós». Felicitações que são um convite a abrir o coração: «Faz com que o Senhor escreva a tua história e que tu deixes que ele a escreva».
17 de Dezembro de 2013

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sábado, 5 de abril de 2014

Falar dos pobres é uma bandeira do Evangelho e não do comunismo, diiz Papa Francisco

Foi transmitida na noite desta quinta-feira pela televisão pública flamenga da Bélgica VRT, a entrevista que o Papa Francisco concedeu a alguns jovens belgas, em 31 de março. 

Foi um encontro alegre e familiar, num clima de grande simplicidade: entre os jovens encontrava-se também uma jovem agnóstica que diz sentir-se inspirada pelas palavras do Papa Francisco.
Perguntaram-lhe, em primeiro lugar, por qual motivo aceitou a entrevista. O Papa respondeu que para ele é um serviço precioso falar à inquietude dos jovens. Depois, uma pergunta à queima-roupa: "O senhor é feliz? E por que é feliz?"
"Absolutamente! Absolutamente sou feliz (disse sorrindo)!... E é também uma felicidade tranquila, porque a esta idade não é a mesma felicidade de um jovem, há uma diferença. Mas uma certa paz interior, uma paz grande, felicidade, que chega com a idade, também. E inclusive com um caminho que sempre teve problemas. Também agora existem problemas, mas essa felicidade não vai embora com os problemas, não: enxerga os problemas, sofre por causa deles e segue adiante, faz algo para resolvê-los e segue adiante. Mas no fundo do coração há esta paz e esta felicidade. Para mim, verdadeiramente, é uma graça de Deus. É uma graça! Não é mérito próprio."
Os jovens perguntaram o motivo de seu grande amor pelos pobres: "Porque é o coração do Evangelho", respondeu Francisco:
"Para mim, o coração do Evangelho é dos pobres. Dois meses atrás ouvi que uma pessoa disse, por isto, por falar sobre os pobres, por ter essa preferência: "Esse Papa é comunista!" Não. Essa é uma bandeira do Evangelho, não do comunismo: do Evangelho! Mas a pobreza sem ideologia, a pobreza... E por isso creio que os pobres estão no centro do anúncio de Jesus. Basta ler o Evangelho. O problema é que depois, algumas vezes, na história, essa postura em relação aos pobres foi ideologizada."
A jovem agnóstica perguntou ao Papa qual é a mensagem que ele tem para todos os jovens:
"Todos somos irmãos, crentes, não crentes, desta ou de outra confissão religiosa, judeus, muçulmanos... todos somos irmãos! O homem está no centro da história, e isso para mim é muito importante: o homem é o centro. Neste momento da história o homem foi tirado do centro, foi jogado na periferia, e no centro – ao menos neste momento – está o poder, o dinheiro, e nós devemos trabalhar em prol das pessoas, do homem e da mulher, que são a imagem de Deus."
Hoje "entramos numa cultura do descarte", prosseguiu o Papa. "As crianças são excluídas – não se quer crianças, queremos menos crianças, famílias pequenas: não se quer crianças. "
"Os anciãos são excluídos: muitos deles morrem em decorrência de uma eutanásia escondida, porque não se cuida deles e acabam morrendo. E agora os jovens são excluídos."
O Santo Padre recordou que na Itália o desemprego juvenil dos 25 anos abaixo é de quase 50%. Mas recordando seus encontros com alguns jovens políticos argentinos, afirmou ter confiança neles e na vontade deles de concretude:
"E fico contente porque eles, quer de esquerda, quer de direita, falam uma nova música, com uma nova música, um novo estilo de política. E isso me dá esperança. E creio que a juventude, neste momento, deve assumir a luz e seguir adiante. Que sejam corajosos! Isso me dá esperança."

Perguntado sobre a busca que o homem faz de Deus, o Papa respondeu:
"Quando o homem encontra a si mesmos, busca Deus. Talvez não consiga encontrá-lo, mas segue num caminho de honestidade, buscando a verdade, por um caminho de bondade e um caminho de beleza... está num bom caminho e seguramente encontrará Deus! Mais cedo ou mais tarde o encontrará. Mas o caminho é longo e algumas pessoas não o encontram, na vida. Não o encontram conscientemente. Mas são muito verdadeiras e honestas consigo mesmas, muito boas e muito amantes da beleza, que acabam tendo uma personalidade muito madura, capaz de um encontro com Deus, que é sempre uma graça. Porque o encontro com Deus é uma graça."



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Falar dos pobres é uma bandeira do Evangelho e não do comunismo, diiz Papa Francisco

A Bíblia e o tráfico humano na atualidade - O papel solidário e profético da comunidade de Jesus

Atualmente, a maioria dos cristãos ainda ignora a situação do tráfico humano ou lhe é indiferente. Hoje o tráfico de pessoas é tão perverso quanto no tempo em que as Américas estavam sendo colonizadas. Há suspeitas de que as receitas provenientes do tráfico humano superem as do comércio ilegal de armas e de que, em breve, esse crime ultrapassará o tráfico de drogas para chegar ao topo das atividades ilegais no mundo.
É tarefa dos cristãos, em nome de Jesus de Nazaré, que deu a própria vida na cruz para nos resgatar do pior tipo de escravidão que é o pecado, empenhar esforços para que os milhões de vítimas do tráfico sexual sejam libertados e as vítimas do tráfico de mão de obra voltem para junto de suas famílias.
Nos tempos bíblicos, a escravidão se instaurou por causa do pagamento de dívidas familiares. Hoje, a “necessidade” que gera a escravidão é muito mais ilusória e vil: a fabricação de produtos com baixo custo – para lucrar cada vez mais – e o sexo barato. A Bíblia se preocupa em promover práticas trabalhistas justas (1Tm 5,18) e relações sexuais saudáveis, sem exploração da pessoa humana (1Cor 7,2).
Apesar disso, há o silêncio da maioria dos cristãos que dizem praticar as Escrituras. Há conivência com a adoção ilegal, sem que se perguntem de onde a criança veio e se não teria sido raptada de seus pais. A maioria dos cristãos se cala quando se trata de multinacionais que usam mão de obra em condições de escravidão. Essa postura é uma antítese do cuidado bíblico para com os servos. Os cristãos, alicerçados na lei do amor (1Jo 3,16), são convocados a gastar suas energias em favor daqueles que estão escravizados; devem ajudar a levar vida plena, pois todos já foram libertados em Cristo.
E não podemos concluir este artigo sem uma palavra de esperança para as pessoas traficadas e para as famílias das vítimas. No fim da narrativa, José faz uma leitura positiva dos acontecimentos dolorosos pelos quais passou (Gn 50), Deus havia convertido o mal em grande bem. Esse final convida as famílias de hoje, mesmo quando há vítimas fatais, a ver a ação discreta de Deus como companhia nos sofrimentos, como presença eficaz ao lado de quem sofre, na certeza de que a vítima não foi abandonada por ele em nenhum momento.
O Senhor disse: “Eu vi, eu vi a miséria do meu povo que está no Egito. Ouvi o seu clamor por causa dos seus opressores, pois eu conheço as suas angústias. Por isso desci a fim de libertá-lo da mão dos egípcios, e para fazê-lo subir daquela terra a uma terra boa e vasta, terra que mana leite e mel (…). Agora, o clamor dos filhos de Israel chegou até mim, e também vejo a opressão com que os egípcios os estão oprimindo. Vai, pois, e eu te enviarei ao Faraó, para fazer sair do Egito o meu povo, os filhos de Israel” (Ex 3,7-10).
Os verbos empregados indicam a presença constante de Deus junto ao povo: eu vi, eu ouvi, eu conheço as angústias dele, eu desci, eu te envio. Que os seguidores de Jesus não desconsiderem esse apelo do Senhor, que conta conosco para novamente tirar seu povo da escravidão e da mão do opressor.

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Fraternidade e tráfico humano: reflexão socioteológica

A CF-2014 escolheu como tema uma das formas de criminalidade atuais que envergonham a humanidade, o tráfico humano. Pretende-se com a campanha contribuir para reforçar a conscientização, a prevenção, a denúncia e o repúdio com relação a essa atividade ilegal, além de apelar tanto para o Estado como para toda a sociedade civil a fim de que se empenhem em coibir tal iniquidade.
Assusta-nos até onde chega a perversidade de traficar seres humanos como se fossem coisas. A humanidade, depois de tristes e violentos invernos de maldade, chegou, em 1948, à Declaração dos Direitos Humanos. O texto começa com uma série de considerandos. O primeiro soa solene: “Considerando que o reconhecimento da dignidade inerente a todos os membros da família humana e de seus direitos iguais e inalienáveis é o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no mundo”. Antes de tudo, está a dignidade de cada ser humano, que goza de igualdade de direitos inalienáveis. Sobre ela se constroem a liberdade, a justiça e a paz.
Girando negativamente, a dominação, a injustiça e a guerra nascem da violação de tais direitos. O texto tira outra óbvia conclusão de que atos bárbaros, que ultrajaram a consciência da Humanidade, decorreram do desprezo e desrespeito de tais direitos.
A CF-2014 escolheu como tema um desses atos perversos, que nos envergonham – o tráfico humano associado à escravidão, ao campo sexual e ao tráfico de órgãos –, a fim de despertar e reforçar na consciência dos brasileiros o repúdio por tal prática. Além disso, apela tanto para o Estado como para toda a sociedade civil a fim de que se empenhem em coibir tal iniquidade, infelizmente ainda presente em nosso país.
Assim vemos que no Concílio Vaticano II (1962-1965) e na América Latina, especialmente depois do encontro dos bispos em Medellín (1968), a Igreja católica tem assumido nítida defesa dos direitos humanos e vigorosa batalha contra o trabalho escravo. Por isso, ela tomou uma de suas faces, o tráfico humano, como tema da CF-2014.
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quarta-feira, 2 de abril de 2014

A Igreja de Comunhão na LUMEN GENTIUM

A Lumen Gentium representa, em primeiro lugar, a reconquista da consciência da Igreja de ser “mistério de comunhão”, ou seja, a comunhão de vida com Deus, na humanidade de Cristo, que aproxima os fiéis na unidade da Trindade pelo vínculo do Espírito. 


Enquanto mistério de comunhão da união pessoal de cada homem com a Santíssima Trindade e com os outros homens, iniciada na fé e orientada para a plenitude escatológica, a comunhão é um conceito que está na autocompreensão da Igreja.


Em segundo lugar, pela manifestação histórica da Igreja no plano salvífico a Igreja é entendida como “Povo de Deus”. Pelo batismo todos se tornam membros da Igreja e participantes da tríplice missão de Cristo: profeta, sacerdote e rei. 

Por último, pela sua visibilidade enquanto comunidade de fé, a Igreja também precisa de uma organização hierárquica e juridicamente constituída, ou seja, há necessidade de uma estrutura organizada.


Com o termo “mistério” os padres compreendiam a designação da Igreja como “uma realidade divina, transcendente e salvífica, que é revelada e manifestada de um modo visível”.

Perpassando a evolução dos debates conciliares, desde o esquema preparatório, passando pelo segundo esquema até chegar a atual redação percebe-se a passagem da identidade entre corpo místico e Igreja romana para uma impostação cristológica. Da impostação cristológica para aquela Trinitária do mistério da Igreja. A consideração trinitária não só privilegia a comunhão mística, mas também faz sair dos esquemas societários a proposição do lado visível da Igreja e do seu nexo com aquele invisível. 

“A Igreja é situada como o fim do desenho criador e salvífico do Pai; da obra redentora do Filho e da comunicação do Espírito Santo, que aproxima na unidade o povo dos redimidos”. A conseqüência imediata desta nova impostação é que o fim das operações divinas não é a instituição eclesiástica, mas é a Igreja toda: “assim a Igreja toda aparece como um povo unido pela unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo”.

Em Cristo fonte de toda graça, se dá a comunhão dos homens com Deus e é dele que a Igreja depende por inteiro em cada aspecto de sua vida: “todos os homens são chamados a esta união com Cristo, que é a luz do mundo, do Qual procedemos, por Quem vivemos e para Quem tendemos.”

A constituição também faz uma correlação cristológica-pneumatológica oferecendo uma correta compreensão do Espírito Santo como sendo presença santificante da Igreja: “ao comunicar o seu Espírito, fez de seus irmãos, chamados de todos os povos, misticamente os componentes de seu próprio Corpo”.


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O Povo de Deus como realidade histórica

O povo Deus é um povo peregrino, pois ele faz caminho histórico entre a promessa e o cumprimento. “O que constitui um povo é, em primeiro lugar, a vida comum, a vida sofrida e assumida em comum”

A Lumen Gentium especifica de maneira clara que o sofrimento do povo Deus no caminho do deserto é também o caminho do novo Israel, é a “Igreja de Deus”, que é a “Igreja de Cristo” edificada sobre a rocha de Pedro (Mt 16,18), ela é do tempo presente a caminho da cidade eterna:

Como o Israel segundo a carne, que peregrinava no deserto, já é chamado Igreja de Deus (2 Esd 13,1; cf. Nm 20,4; Dt 23,1ss), assim o novo Israel que, caminhando no presente tempo, busca a futura cidade perene (cf. Hb 13,14), também é chamado Igreja de Cristo (cf. Mt 16, 18). Pois o próprio Cristo adquiriu-a com o seu sangue (cf. At 20,28), encheu-a de seu Espírito e dotou-a de meios aptos de união visível e social. Deus convocou e constituiu a Igreja – comunidade congregada daqueles que, crendo, voltam seu olhar a Jesus, autor da salvação e princípio da unidade e da paz - a fim de que ela seja para todos e para cada um “o sacramento visível desta unidade salvadora” (S. Cipriano, Pist. 69,6; PL 3, 1142B; Hartel 3B, p. 754: inseparabilis unitatis sacramentum). Devendo estender-se a todas as regiões da terra, ela entra na história dos homens, enquanto simultaneamente transcende os tempos e os limites dos povos. Andando, porém através de tentações e tribulações, a Igreja é confortada pela força da graça de Deus prometida pelo Senhor, para que na fraqueza da carne não decaia da perfeita fidelidade, mas permaneça digna esposa de seu Senhor e, sob a ação do Espírito Santo, não deixe de renovar-se a si mesma, até que pela cruz chegue à luz que não conhece ocaso.

A Igreja enquanto Povo de Deus se dirige a todos os povos sem negar sua unidade, formando uma unidade na pluralidade cultural dos povos. Estando acima de toda evolução histórica ela não deixa de ser atingida pelos contextos históricos e pelos acontecimentos terrenos: “é de extrema importância para a reta compreensão da doutrina sobre a Igreja levar em consideração que Cristo, ao fundar sua Igreja como algo de perene e inconfundível, todavia a inseriu na História em busca de sua meta final, a futura cidade perene”

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