sexta-feira, 29 de agosto de 2014

Diálogo judeu-católico e judeu-cristão

Nos últimos anos a Igreja tentou fazer uma revisão da história e de seu relacionamento com o judaísmo. Encíclicas e tratados foram apresentando uma visão diferente dos judeus para a própria Igreja. Ver Nostra Aetate, ver Concílio Vaticano II.

Os preconceitos anti-semitas derrubam o diálogo inter-religioso, por isso destaco a importância dos chamados 10 Pontos de Seelisberg, fruto de um colóquio judeu-cristão, elaborados na França em 1947, que serviram como base para muitos outros documentos:

l. Deve-se relembrar que um só e mesmo Deus nos fala no Antigo e no Novo Testamento.
2. Não se pode esquecer que Jesus nasceu de mãe judia, pertencia à família de Davi e ao povo de Israel, e que seu amor eterno abrange o seu povo e o mundo inteiro.
3. Recorde-se ainda que os primeiros discípulos, os apóstolos e os primeiros mártires eram judeus.
4. Tenha-se presente que o principal mandamento do cristianismo, o amor de Deus e do próximo, anunciado no Antigo Testamento e confirmado por Jesus, obriga igualmente cristãos e judeus, em todas as relações humanas.
5. Deve-se evitar diminuir o judaísmo bíblico e pós-bíblico para exaltar o cristianismo.
6. Não se deve empregar a palavra “judeu” para designar exclusivamente os inimigos de Jesus, e as palavras “inimigos de Jesus” para designar o povo judeu em seu conjunto.
7. Não se deve apresentar a Paixão de Jesus como se todos os judeus, ou somente os judeus, tivessem incorrido na odiosidade da crucificação. Não foram todos os judeus que pediram a morte de Jesus, nem foram somente judeus que se responsabilizaram por ela. A Cruz, que salva a humanidade, revela que Cristo morreu pelos pecados de todos. Pais e mestres cristãos deveriam ser alertados a respeito de sua grande responsabilidade na maneira de narrar os padecimentos de Jesus. Se o fazem de uma forma superficial, correm o risco de fomentar aversões no coração das crianças ou dos ouvintes. Numa mente simples, movida por um ardente amor compassivo pelo Salvador crucificado, o horror natural dos perseguidores de Jesus pode facilmente tornar-se, por motivos psicológicos, ódio indiscriminado pelo judeu de todos os tempos, inclusive de nossos dias.
8. Não se devem evocar as condenações bíblicas e o grito da multidão enraivecida: “Que seu sangue caia sobre nós e sobre nossos filhos” (Mt 27,25) sem relembrar que esse grito não anulou as palavras de nosso Senhor, de conseqüências incomparavelmente maiores: “Pai, perdoa-lhes; eles não sabem o que fazem” (Lc 23,24).
9. É preciso evitar qualquer tentativa de mostrar os judeus como um povo reprovado, amaldiçoado e votado a um sofrimento perpétuo.
10. Deve-se mencionar que os primeiros membros da Igreja eram judeus.

Uma viagem no tempo

Se voltamos ainda mais na história, encontraremos a total intolerância na época das Cruzadas (1099-1291 da Era Comum) e na época dos Grandes Impérios. Quando o catolicismo tornou-se religião oficial do Império Romano, os judeus foram mais perseguidos que outros povos por motivos religiosos.
A destruição do Segundo Grande Templo de Jerusalém, no ano 70 da Era Comum, desestimulou qualquer forma de diálogo, gerando, pelo contrário, reações de revolta religiosa. Ver a história dos Macabeus. Ao longo da história, os inimigos do povo de Israel tinham como primeiro objetivo destruir o Grande Templo de Jerusalém. Achavam que com a destruição do centro espiritual judaico conseguiriam a dispersão e assimilação dos judeus. É interessante que o judeu conseguiu reconstruir seu micro-universo e, acima de tudo, produzir novas fontes de expressão cultural seja onde for.

Nessas circunstâncias não existia muita margem para um diálogo inter-religioso. O judeu estava preocupado com a sua sobrevivência. Se chegamos à origem do cristianismo, o afastamento entre judeus e Jesus se deu mais na época dos apóstolos. Jesus e seus discípulos apareciam como um partido religioso dentro da comunidade judaica. Quando ouve discordância de critérios e princípios, o diálogo passou a segundo plano. Poderíamos dizer que em todos os tempos existiu intenção de diálogo entre judeus e cristãos, muitas vezes frustrado por fatos históricos e pelo egoísmo dos líderes que tentaram privar as suas comunidades de um relacionamento normal e civilizado.

Diálogo inter-religioso no Brasil

Desde 1962, desenvolveu-se um trabalho de relacionamento fraterno entre judeus e cristãos, através do Conselho de Fraternidade Cristã-Judaica, que continua a realizar diversas atividades culturais e religiosas, com o objetivo de um conhecimento mútuo e difusão dos laços comuns entre as religiões judaica e cristã.

Em 1981, foi criada, por iniciativa da CNBB, a Comissão Nacional do Diálogo com os Judeus, contando com a participação de cinco membros nomeados pela CNBB e cinco judeus convidados pela mesma entidade. Sua finalidade é articular em nível nacional o diálogo oficial da Igreja Católica no Brasil com a comunidade judaica no país. O expoente máximo da comunidade judaica que participa da Comissão é o rabino Henry Sobel, presidente do Rabinato da Comunidade Israelita Paulista (CIP). Em Porto Alegre, a instituição que lidero, SIBRA, faz parte do Grupo de Diálogo Inter-Religioso que funciona na Associação Cristã de Moços (ACM). Há seis anos que participo do grupo, ministrando palestras, participando em cultos, inaugurações, atos oficiais, visitando presídios e fazendo campanhas de agasalhos. O nosso objetivo é educar as nossas comunidades para vencer os preconceitos e a ignorância, que criam barreiras e impedem uma aproximação sincera entre as religiões. Só na hora que conhecermos os nossos irmãos na sua forma de ser e pensar, poderemos respeitá-los.

Fonte:

Guershon Kwasniewski, Diálogo judeu-católico e judeu-cristão, in: Estudos Teológicos, 42(2):73-77, 2002.

A Igreja católica e a comunidade judaica

Sondando o mistério da Igreja, este sagrado Concílio recorda o vínculo com que o povo do Novo Testamento está espiritualmente ligado à descendência de Abraão.

Com efeito, a Igreja de Cristo reconhece que os primórdios da sua fé e eleição já se encontram, segundo o mistério divino da salvação, nos patriarcas, em Moisés e nos profetas. Professa que todos os cristãos, filhos de Abraão segundo a fé (6), estão incluídos na vocação deste patriarca e que a salvação da Igreja foi misticamente prefigurada no êxodo do povo escolhido da terra da escravidão. A Igreja não pode, por isso, esquecer que foi por meio desse povo, com o qual Deus se dignou, na sua inefável misericórdia, estabelecer a antiga Aliança, que ela recebeu a revelação do Antigo Testamento e se alimenta da raiz da oliveira mansa, na qual foram enxertados os ramos da oliveira brava, os gentios (7). Com efeito, a Igreja acredita que Cristo, nossa paz, reconciliou pela cruz os judeus e os gentios, de ambos fazendo um só, em Si mesmo (8).

Também tem sempre diante dos olhos as palavras do Apóstolo Paulo a respeito dos seus compatriotas: «deles é a adopção filial e a glória, a aliança e a legislação, o culto e as promessas; deles os patriarcas, e deles nasceu, segundo a carne, Cristo» (Rom. 9, 4-5), filho da Virgem Maria. Recorda ainda a Igreja que os Apóstolos, fundamentos e colunas da Igreja, nasceram do povo judaico, bem como muitos daqueles primeiros discípulos, que anunciaram ao mundo o Evangelho de Cristo.

Segundo o testemunho da Sagrada Escritura, Jerusalém não conheceu o tempo em que foi visitada (9); e os judeus, em grande parte, não receberam o Evangelho; antes, não poucos se opuseram à sua difusão (10). No entanto, segundo o Apóstolo, os judeus continuam ainda, por causa dos patriarcas, a ser muito amados de Deus, cujos dons e vocação não conhecem arrependimento (11). Com os profetas e o mesmo Apóstolo, a Igreja espera por aquele dia. só de Deus conhecido, em que todos os povos invocarão a Deus com uma só voz e «o servirão debaixo dum mesmo jugo» (Sof. 3,9) (12).

Sendo assim tão grande o património espiritual comum aos cristãos e aos judeus, este sagrado Concílio quer fomentar e recomendar entre eles o mútuo conhecimento e estima, os quais se alcançarão sobretudo por meio dos estudos bíblicos e teológicos e com os diálogos fraternos.

Ainda que as autoridades dos judeus e os seus sequazes urgiram a condenação de Cristo à morte (13) não se pode, todavia, imputar indistintamente a todos os judeus que então viviam, nem aos judeus do nosso tempo, o que na Sua paixão se perpetrou. E embora a Igreja seja o novo Povo de Deus, nem por isso os judeus devem ser apresentados como reprovados por Deus e malditos, como se tal coisa se concluísse da Sagrada Escritura. Procurem todos, por isso, evitar que, tanto na catequese como na pregação da palavra de Deus, se ensine seja o que for que não esteja conforme com a verdade evangélica e com o espírito de Cristo.

Além disso, a Igreja, que reprova quaisquer perseguições contra quaisquer homens, lembrada do seu comum património com os judeus, e levada não por razões políticas mas pela religiosa. caridade evangélica. deplora todos os ódios, perseguições e manifestações de anti-semitismo, seja qual for o tempo em que isso sucedeu e seja quem for a pessoa que isso promoveu contra os judeus.

De resto, como a Igreja sempre ensinou e ensina, Cristo sofreu, voluntariamente e com imenso amor, a Sua paixão e morte, pelos pecados de todos os homens, para que todos alcancem a salvação. O dever da Igreja, ao pregar, é portanto, anunciar a cruz de Cristo como sinal do amor universal de Deus e como fonte de toda a graça.

Fonte:

COMO É A IGREJA ORTODOXA

Oficialmente, adotam o nome de Igreja Católica Apostólica Ortodoxa, também chamada de grega cismática em oposição à Igreja Latina, de Roma. Para os ortodoxos foi a Igreja de Roma que rompeu com a tradição apostólica e por isso se consideram os únicos depositários da doutrina apostólica e representante da fé cristã no Oriente. Aceitam a Bíblia, e a Sagrada Tradição, como os católicos, e a sua doutrina se baseia na Sagrada Escritura, nos sete primeiros concílios ecumênicos e nas obras dos Santos Padres. Conservam os sete sacramentos deixados por Cristo e a missa sempre solene é pouco freqüente. Não usam instrumentos, inclusive o órgão, cabendo ao coral importante papel nos trabalhos litúrgicos. Não aceitam o purgatório, o primado do papa e a sua infalibilidade. Para eles o Espírito Santo procede somente do pai e não do filho. Negam o dogma da Imaculada Conceição mas têm uma excepcional veneração por Nossa Senhora e celebram a sua Assunção ao céu. É proibido o uso de imagens esculpidas mas permite-se as imagens pintadas. Veneram os santos a admitem ícones (imagens) representando Cristo, a Virgem Maria ou outro santo destacado. A liturgia é centro da vida ortodoxa, tanto para a expressão da fé como para a educação dos fiéis. Assim como na Igreja Romana, os graus da ordem são três:  diáconos, padres e bispos. A autoridade suprema regional é o Santo Sínodo Tópico formado pelos metropolitas (chefes das arquidioceses). O Patriarca Ecumênico de Constantinopla recebe o título de sua Santidade enquanto os demais patriarcas, os de sua Beatitude. Bispos, arcebispos, metropolitas e patriarcas são iguais na sucessão. Os padres podem se casar mas os bispos são escolhidos entre os solteiros.

Embora o cisma ocorresse em 858, a separação definitiva só se deu em 1054. Várias tentativas de reaproximação foram feitas posteriormente (a maior com o papa Eugênio IV, no Concílio de Florença, Século XIII) mas todas fracassaram. Mais tarde, com a queda de Constantinopla no ano de 1453, tomada pelos turcos muçulmanos, o Império Romano do Oriente (Bizâncio) deixou de existir. O Ocidente foi acusado de não socorrer seus irmãos do Oriente na luta contra os turcos e portanto a união ficou mais inviável ainda.


A igreja Ortodoxa se espalhou pelo Oriente, se fixou na Grécia, Bálcãs (Romênia, Bulgária, Iugoslávia... ) na Rússia e Finlândia entre outros países. Teve um papel importante na Rússia, durante o regime imperial, até 1917. Hoje os principais patriarcados são os de Istambul (antiga Constantinopla) na Turquia, Alexandria (Egito), Jerusalém, e Antioquia (na Síria). Os ortodoxos espalharam sua fé até lugares distantes como Austrália, Japão, Estados Unidos e no Brasil, onde se encontram mais na região sul do país.

Fonte:

O CISMA DO ORIENTE: SURGE A IGREJA ORTODOXA.

A Igreja Ortodoxa surgiu no século IX de nossa época e foi causa da primeira separação ocorrida no cristianismo. Até então a Igreja Romana era a única para os cristãos. Na verdade uma série de fatores contribuíram para essa divisão.

Desde a morte dos apóstolos Pedro e Paulo no ano 67 a sede da Igreja ficou sendo Roma, onde eles foram martirizados. Todos os papas seguintes mantiveram  a cidade eterna como sede pontifícia. Roma era, ao mesmo tempo, sede da Igreja e capital do Império Romano. Mais tarde, no ano 330, a capital do império foi transferida para Constantinopla, no Oriente. No ano 396 o Imperador Teodósio dividiu o Império Romano para deixá-lo aos seus dois filhos. Roma ficou sendo a capital do Ocidente enquanto Constantinopla ficou sendo a capital do império no Oriente. Por Constantinopla já ter sido a capital do império anteriormente, havia um desejo no Oriente de que a sede papal fosse lá. Como a Sé Apostólica permanecesse  em Roma muitos queriam que o patriarca de Constantinopla fosse, no mínimo, um igual ao papa.

O Império Romano do Ocidente entrou em decadência e deixou de existir quando, no ano 476, os bárbaros conquistaram Roma e destituem o último imperador do Ocidente, Rômulo Augústulo. Roma cai mas a Igreja sai ganhando com isso pois a fé se espalha entre os bárbaros e se estende pela Europa com a conversão dos povos pagãos. O Império Romano do Oriente, que sobreviveu, passa a se chamar Bizâncio e vai durar ainda mil anos.

No ano de 868, César Bardas, homem imoral e viciado, tio do Imperador Miguel III de Bizâncio, foi excomungado pelo Patriarca Inácio, de Constantinopla. Indignado, ele insta o sobrinho-imperador fazendo com que este destituísse Inácio. Este é destituído do Patriarcado e  preso, por ordem de Miguel III, e desterrado para a Ilha de Terebinto. Em seguida, com o apoio do sobrinho-imperador, César Bardas consegue eleger Fócio comandante da guarda imperial, a quem Miguel III favorecia, como bispo para ocupar o patriarcado de Constantinopla em lugar de Inácio. A sagração de Fócio foi cercada de irregularidades: o novo prelado recebeu em apenas cinco dias todas as ordens sagradas e foi empossado pelo Imperador Miguel III como patriarca de Constantinopla sem a aprovação de Roma e sem que a sede estivesse vaga pois Inácio, o legitimo patriarca não havia renunciado nem tinha sido destituído legalmente pelo Papa. Nicolau I. Além disso, Fócio fora sagrado por um bispo que não estava mais em comunhão com a Santa Sé. A sagração foi portanto irregular. Mas Fócio ama o poder e manda espalhar que Inácio fora desterrado por ter conspirado contra o imperador. Também achava que o papa aceitaria sua nomeação porque precisaria do auxílio das tropas bizantinas para proteger os cristãos na luta contra os sarracenos muçulmanos. Mas o Papa Nicolau I lhe opôs enérgica resistência e não aceitou sua indicação e sagração irregular. Em seguida o papa declarou solenemente, em 863, que Fócio estava destituído (naturalmente) das funções pastorais.

Assim, não conseguindo impor-se com o apoio papal, Fócio convoca um concílio irregular em Constantinopla (a maioria dos bispos estava suspenso de ordens) e obtêm dessa forma a aprovação para o patriarcado. O Papa Nicolau I condena os decretos do Concílio irregular e excomunga Fócio. Este rompe com o papa provocando o Cisma do Oriente. Dessa forma a Igreja de Bizâncio, seguindo a Fócio, cai no cisma que dolorosamente separa os cristãos do Oriente da Igreja de Roma.

Fonte:

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Fundamentos bíblicos sobre o ecumenismo

            O “manifesto ecumênico” por excelência é a oração de Jesus por seus seguidores “a fim de que todos sejam um... como nós somos um” (Jo 17,21-22). A oração de Jesus “sugere – abrindo perspectivas inacessíveis à razão humana – que há uma certa analogia entre a  união das pessoas divinas entre si e a união dos filhos de Deus na verdade e na caridade” (GS 24; UUS 26). Tanto em sua vida quanto em sua morte Jesus buscou “trazer à unidade os filhos de Deus que andavam dispersos” (Jo 11, 51-52). E a unidade que Jesus quer para os discípulos é condição da credibilidade na missão: “para que o mundo creia”.

            O conjunto da mensagem bíblica apresenta a unidade como projeto de Deus. A Bíblia começa e termina com símbolos potentes de unidade: no jardim do Éden a imensa variedade da humanidade é apresentada num único casal (Gn 2,18-24), para nos mostrar que somos todos, neste planeta, uma grande família amada pelo Criador; a Nova Jerusalém do Apocalipse é uma cidade só, com doze portas sempre abertas, sinal de hospitalidade para todos os povos, unidos na presença de Deus, sem necessidade de um templo que identifique uma só tradição (Ap 21).

            Mas o pecado entra em cena promovendo a divisão (Gn 3). Logo depois do relato do paraíso, irmão se lança contra irmão, por ciúme diante de uma oferta feita a Deus (Gn 4). É um sinal de quebra do projeto inicial de Deus. Também o episódio da torre de Babel (Gn 11) mostra que o desentendimento é conseqüência do orgulho humano.

            No Primeiro Testamento, é central a escolha do povo de Israel como povo de Deus (Cf Jz 5,11; 1Sm 2,24). À Abraão, Deus promete que será feita uma grande e abençoada nação (Gn 12,2). O Deus de Israel é Deus de todos os povos. Mas como Israel entendeu isso? A eleição de Israel levou muitas vezes à exclusão dos outros povos. O livro de Jonas é uma chave de interpretação ecumênica no Primeiro Testamento = a eleição de Israel não é uma escolha exclusivista: o que se inicia com  Abraão será uma bênção para todas as famílias da terra (Gn 12,3). Apesar de toda a necessidade que o povo tem de preservar sua identidade, estrangeiros podem ajudar, e se tornam parte da história, como acontece, por exemplo, com Jetro, Rute, Ciro...

            No Segundo Testamento, Jesus mostra aos discípulos que “Um só é o vosso Pai” (Mt 23, 9), Abbá, que o próprio Cristo invoca, como Filho unigênito. Ensina também que “Um só é o vosso Mestre e vós sois todos irmãos” (Mt 23, 8). Assim, os discípulos são “um só em Cristo” (Gl 3,28), “filhos no Filho” (Ef 1,5), “concidadãos dos santos”, “família de Deus” (Ef 2, 19-22). Devem, portanto, levar os fardos uns dos outros (Gl 6,2) e “guardar a unidade do espírito pelo vínculo da paz” (Ef 4,3), respondendo pela “esperança que há em vós” (1Pd 3,15).
Jesus mesmo dá o exemplo disso pela acolhida a pessoas que outros rejeitariam; ele consegue até unir no mesmo grupo um zelota e um cobrador de impostos...

            A Igreja torna-se herdeira da bênção que Deus deu a Abraão e que se realiza definitivamente em cristo. É a bênção que gera comunhão na oração, na fração do pão, na doutrina comum, na distribuição dos recursos materiais (At 2,42; 4,32-35; 2Cor 8-9). O grande sinal que marca o nascimento da Igreja comunhão vem em Pentecostes (At 2):  há uma única mensagem, mas cada um a recebe na sua própria língua (At 2, 9). É um ícone da unidade na diversidade, o contrário da confusão na Torre de Babel (Gn 11, 9).

            Todo o trabalho de Paulo será feito na diversidade de povos e comunidades com histórias diferentes. Ele vê a Igreja como um corpo, que se torna mais eficiente exatamente por causa da diversidade de membros que colaboram para um único organismo (1Cor 12, 12-31). Paulo mostra o fundamento da unidade do corpo: “um só Senhor, uma só fé, um só batismo”(Ef 4,5). 

            Nos Atos dos Apóstolos vemos que “todos os que abraçavam a fé estavam unidos” (At 2,44). A comunicação era difícil naquele tempo, a Igreja ainda estava se organizando, cada comunidade deveria ter seu jeito próprio... mas estavam de acordo no essencial e foram capazes de realizar o milagre de espalhar a mensagem que poderia ter ficado restrita a um pequeno grupo de judeus seguidores do judeu Jesus. Assim, nossa própria história de fé, fundamentada nas Escrituras Sagradas, nos aponta a unidade na diversidade como um caminho eficiente e desejado por Deus.

            Portanto, nosso olhar para a Bíblia deve ser um ato ecumênico. Sua compreensão nos orienta para a Igreja comunhão de todos os fiéis em Cristo. O ecumenismo é, antes de tudo, uma busca de fidelidade à Palavra de Deus que cria essa comunhão. Por isso torna-se também uma dimensão da Igreja que se constitui e se fundamenta nessa Palavra.

Fonte:

Comissão Episcopal Pastoral para o Ecumenismo e o Diálogo Interreligioso - CNBB 48ª Assembleia Geral da CNBB Brasília, 4 a 13 de maio de 2010

Sentido etimológico de Ecumenismo

O que é ecumenismo?

A palavra ‘ecumenismo’ pode designar vários sentidos ou significados. Antes de apresentar um breve panorama histórico do ecumenismo e o sentido do termo técnico empregado na teologia acadêmica dos dias atuais, faz-se necessário saber sua origem e conhecer a raiz deste termo.

A palavra ecumenismo se origina da palavra grega (oikoumene), formada a partir de duas outras palavras: do substantivo (oikos), que significa casa, habitação, família, habitantes da casa, estirpe, descendência, vivenda, aposento ou povo; e do verbo (meno), que significa ficar, permanecer, esperar, persistir, continuar a ser, a existir, a subsistir.

O termo (oikoumene) pertence a uma família de palavras que designam: morada, habitação, construção, edificação, administração domestica. O termo em questão significa: casa, terra habitada, mundo habitado, ou humanidade. Neste sentido, seria o mundo habitado por diferentes povos. Os gregos empregavam (oikoumene) para designar o mundo sob domínio dos helênicos, dentro dos seus limites próprios. Isto indica que o termo (oikoumene) designava a terra dominada e habitada pelos gregos. Além das fronteiras desta (oikoumene) se situava o mundo dos bárbaros.

De fato, a palavra (oikoumene) foi empregada pelos escritores gregos clássicos (Heródoto, Demostenes, Aristóteles, etc.) para designar o espaço habitado pelos gregos em contraposição ao mundo ou espaço desconhecido pelos gregos, ou seja, seus habitantes eram estranhos para os helênicos. A partir do século IV, este termo passou a designar todo o mundo conquistado por Alexandre, o Grande, desde os territórios gregos ate as margens do Egeu e as margens do Rio Indo. Da mesma forma, os romanos continuaram empregando este termo para indicar os limites fronteiriços de seu domínio (Lc 2.1). Pressupõe-se que, neste sentido, (oikoumene) se trata do Império Romano ou todo o mundo sob o poder dos romanos cujo símbolo do poder politico-ideológico era a Pax Romana. Compreende-se que as perspectivas geográfica e cultural, entrelaçadas, aparecem como significado primeiro da palavra ecumenismo como também, o sentido do termo ecumenismo pode ter se tornando cultural.


Assim, não e possível dizer que a (oikoumene) estivesse em função da pluralidade étnica e cultural. O olhar moderno e ocidental pode fazer-nos interpretar este conceito de (oikoumene) de forma modernizante. No entanto, não havia um sentido de união dos ‘diferentes’, senão pela integração e ordem dentro dos limites do domínio. A (oikoumene) não era união pacifica dos povos dentro de um único sistema, pelo contrario, era a expansão do império sobre os povos vencidos, os quais estavam debaixo da Pax Romana, símbolo da própria forca armada contra a invasão dos bárbaros e contra as insurreições dentro do império. Porem, estamos cientes que dentro dos limites destes domínios havia uma variedade cultural e étnica.

Fonte:

terça-feira, 12 de agosto de 2014

Papa Francisco exorta prudência no "sinal da paz" presente na celebração eucarística

O gesto da paz não deve menosprezar o valor sagrado da Santa Missa e o mistério da comunhão sacramental, por isso “a conveniência de moderar este gesto, que pode adquirir expressões exageradas, provocando certa confusão na assembleia precisamente antes da Comunhão. Seria bom recordar que o alto valor do gesto não fica diminuído pela sobriedade necessária para manter um clima adequado à celebração, limitando, por exemplo, a troca da paz aos mais próximos” (n. 3).
Isso posto, a Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos deseja submeter à prudente consideração das Conferências dos Bispos de cada país, conforme suas realidades, quatro sugestões práticas. São elas:
a) Esclarecer que “o rito da paz alcança já seu profundo significado com a oração e o oferecimento da paz no contexto da Eucaristia. O dar-se a paz corretamente entre os participantes na Missa enriquece seu significado e confere expressividade ao próprio rito”. Portanto, se for para convidar para o gesto da paz de modo “mecânico” ou se for possível prever que a saudação na Missa não atingirá o seu real objetivo, este pode e deve ser omitido, conforme já prescreve o Missal Romano n. 128.
b) Nos locais em que a saudação da paz foi distorcida com a introdução de gestos profanos, as Conferências Episcopais, a mantenham no mesmo lugar, na Missa, mas a substitua “por gestos mais apropriados”.
c) “De todos os modos, será necessário que no momento de dar-se a paz se evitem alguns abusos tais como: - A introdução de um ‘canto para a paz’, inexistente no Rito romano; - Os deslocamentos dos fiéis para trocar a paz; - Que o sacerdote abandone o altar para dar a paz a alguns fiéis; - Que em algumas circunstâncias, como a solenidade de Páscoa ou de Natal, ou Confirmação, o Matrimônio, as sagradas Ordens, as Profissões religiosas ou as Exéquias, o dar-se a paz seja ocasião para felicitar ou expressar condolências entre os presentes”.
d) As Conferências Episcopais estão convidadas, nesse contexto, a preparar catequeses sobre o Rito da Paz e seu correto desenvolvimento na celebração da Santa Missa seguindo as pistas orientadoras da Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos que acompanham a Carta Circular.
Por fim, pede-se que: a) o gesto da paz, bem vivenciado na Santa Missa, nos faça construtores de um mundo mais justo e pacífico em uma relação entre o que se reza, se crê e se vive (cf. n. 7); b) os Bispos, e, em comunhão com eles, os sacerdotes, aprofundem o significado do rito da paz na Santa Missa, na formação litúrgica e espiritual em oportunas catequeses aos fiéis, pois nesse gesto humano elevado ao âmbito do sagrado a paz do Senhor Ressuscitado é invocada, anunciada e difundida (cf. n. 8).

Fonte: