segunda-feira, 4 de novembro de 2013

O Logos e Deus





Deus e Logos formam certa unidade primordial. Este é o conteúdo essencial dos dois primeiros versículos do prólogo. Na esfera do divino, Deus não está só: aparece junto a ele outro ser, paradoxalmente distinto e idêntico, o Logos. As expressões usadas tendem mais a uma diversificação de ambas as pessoas do que à sua mútua união. Se só possuíssemos este texto, seríamos tentados a postular uma dualidade em Deus, dois deuses.

O Logos não é uma criação de Deus, não é como a sabedoria judaica “aquela que foi gerada antes doa abismos” (Pr 8,22s); pertence desde sempre à ordem divina, incriada. Deus se faz presente no Logos e isto antes da constituição do mundo, no tempo infinito de Deus. O logos é Deus e está junto de Deus. A mesma realidade de ressuscitado, daquele que, na terminologia joanina, está junto do Pai.  (13,1; 14,12; 16,10.17.28; 20,17), aplica-se a Jesus preexistente, que já não é apenas anterior a João Batista (1,30) ou a Abraão (8,58), mas à própria criação: desde sempre “estava junto de Deus”.

Deus sem o Logos estaria incompreensível, sem consistência. Sem o Logos seria impossível chegar a um conhecimento real do que é Deus. Ao contrário dos sinóticos, que dão por conhecido a Deus que demonstra Jesus, em João é justamente o Logos que dá razão de existência a Deus.

O mundo do divino, diz-nos João, não é só o de um Deus isolado na sua solidão de séculos eternos ou o sumo transcendente ao qual havia chegado, por um lado pelo judaísmo tardio e por outro pelo pensamento filosófico grego. Deus foi sempre o mesmo e a sua possibilidade de estabelecer contato com algo mais, que se tem início pela criação.

Neste pensamento, João não é original. Judeus e gentios participaram dele. A sua novidade consiste em fazer coincidir este Logos com a pessoa de Jesus de Nazaré. Fílon, e em geral o fenômeno religioso conhecido como ‘gnose’, o haviam descrito anteriormente, situando-o, porém, numa personalidade confusa e mítica.


Fonte: DE LA CALLE, F.; A Teologia do quarto Evangelho, Edições Paulinas : São Paulo, 1978, p. 40-43, Coleção Teologia dos Evangelhos de Jesus – 4.
 

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