Entre
os anos de 1774-1778 foram publicados os Fragmentos de um até então anônimo professor de línguas orientais Hermann Samuel
Reimarus (1694-1768). Reimarus expõe , com clareza, a distinção entre a
doutrina de Jesus e a doutrina dos apóstolos. Ele sustenta que o Jesus que
existiu realmente em Nazaré e o Cristo pregado nos evangelhos não são o mesmo. No
seu julgar, é necessário diferenciar metodologicamente aquilo que é apresentado
pelos apóstolos daquilo que foi efetivamente o ensinamento de Jesus no curso de
sua vida. Jesus não ensinou profundos mistérios e nem mesmo aspectos relevantes
sobre a fé religiosa. Ao contrário, a sua pregação se ocupou essencialmente de
ensinamentos morais e preceitos de vida. Para Reimarus, o centro da pregação de
Jesus está na convicção da iminência do Reino dos Céus, um Reino já esperado e
aguardado pelos judeus.
As
ideias de Jesus sobre o Reino não se distinguiam essencialmente daquelas ideias
do judaísmo da época. Reimarus sustenta que o anúncio do Reino, na consciência
de Jesus, teria uma conotação terreno-política. Todavia, a sequência dos
eventos culminou com a morte ignominiosa de Jesus. Então, os discípulos, para
não se verem envolvidos no mesmo fracasso do mestre, roubam o seu cadáver e
passam a anunciar a sua ressurreição. Desta forma, se abre um novo cenário:
aquele que pregava o Reino é agora a expressão visível ou a personificação do
Reino. Não mais um reino político-terreno, mas um reino de natureza
escatológica. O sentido escatológico dado à pregação do Reino de Deus, tal como
é possível ler nos evangelhos, se deve, essa é a conclusão de Reimarus, à
pregação dos apóstolos
O
mérito de Reimarus está em trazer para a reflexão teológica a questão da historicidade
dos eventos narrados nos evangelhos e, no particular de nosso interesse, a
questão da compreensão da ressurreição. Um tema que, desde então, não é mais
lido na simples aceitação das narrativas evangélicas como eventos históricos e
que também não pode ser lido somente sob o olhar piedoso da fé. A partir de Reimarus,
o problema da historicidade da ressurreição de Jesus está tão presente na
consciência ocidental, que é possível vê-lo a partir de outras perspectivas,
mas não se pode ignorá-lo. E não é só a questão da ressurreição que exige novas
leituras. As teses de Reimarus suscitaram a necessidade de respostas e posicionamentos.
Toda essa problemática, ainda em forma embrionária, coincide com o aparecimento
da história como ciência. Entende-se, portanto, ter sido justamente da ciência histórica
que surgiram as primeiras tentativas de respostas. Assim, nasce a corrente de
pesquisa que se ocupará de descobrir quem foi, de fato, Jesus de Nazaré.
Fonte: http://www.maxwell.lambda.ele.puc-rio.br/16459/16459_3.PDF
Nenhum comentário:
Postar um comentário